Os Camaleões
18.09.2010 por Carito
Eles vieram da ilha de Madagascar para o mundo: os camaleões.
E não só povoaram outros lugares como também povoaram livros, enciclopédia e nos últimos tempos, claro, invadiram a rede internética. Caiu na rede é camaleão. Tem de tudo que é tipo.
Mudam de lugar, de mídia, e evidentemente, de personalidade e de cor – sua principal característica, se mimetizando com a paisagem geográfica, animal e humana, como uma forma de adaptação, e também de camuflagem, de auto-proteção.
Na literatura transcenderam a parte científica. Aqui mesmo, no Brasil, quando Pedro Bial ainda não era Big Brother foi um Big Camaleão: em 1985 lançou juntamente com outros poetas “O Livro dos Camaleões”. Tinha esse livro lá em casa, era do meu irmão Mário Ivo. E lembro que cada capítulo trazia diferentes camaleões. Algo como: Os Camaleões Psicodélicos, Os Camaleões Descartáveis, Os Camaleões Homossexuais, etc. e tais.
Já Rimbaud, menino prodígio, poeta genial, foi um camaleão enigmático e surpreendente - fez uma mudança radical na sua vida, abandonando precocemente a literatura para ser contrabandista de armas em regiões obscuras até hoje inacessíveis na África. Ayrton Marcondes descreve a trajetória do poeta-aventureiro de espírito inquieto que escreveu apenas até os 20 anos de idade: “Andarilho, jovem mal visto pelos cabelos longos e roupas desleixadas, expulso de Viena, alistamento no Exército Colonial Holandês a caminho de Java onde deserta, intérprete de um circo em Hamburgo, comerciante na África, viajante no Egito e na Etiópia, atravessando o deserto a cavalo, traficante de armas, diretor de feitoria, e morte em conseqüência de um câncer no joelho”.
Fernando Pessoa lançou mão de heterônimos para expressar sua alma de camaleão, do “Eu profundo e os outros Eus”. Mario de Andrade disse: “Eu sou trezentos, sou trezentos-e-cincoenta, mas um dia afinal eu toparei comigo”…
James Douglas Morrison, mais conhecido como Jim Morrison, abriu as portas da percepção e disse: “Sou o Rei Lagarto! Posso fazer tudo!”
O camaleão Robert Allen Zimmerman, mais conhecido como Bob Dylan, teve tantos personagens de si mesmo, que no filme “Não estou lá” foram escolhidos vários atores para expressar os vários Bob Dylans em constante mutação, como uma pedra rolante… “Like a Rolling Stone”…
Teve um camaleão que até cantou para uma camaleoa:
“Rapte-me camaleoa
Adapte-me a uma cama boa
Capte-me uma mensagem à toa
De um quasar pulsando lôa
Interestelar canoa…
Leitos perfeitos
Seus peitos direitos
Me olham assim
Fino menino me inclino
Pro lado do sim…
Rapte-me
Me adapte-me
Me capte-me
It’s up to me
Coração
Ser querer ser
Merecer ser
Um camaleão”…
Mas na música, o camaleão mais famoso foi e continua sendo o Sr. David Bowie, conhecido mundialmente como “O Camaleão do Rock”, que além de mudar constantemente de estilo musical, comportamento e atitude, também resolveu mudar de idade, se tornando com o tempo cada vez mais novo.
No cinema, lembro de Zelig – filme de Woody Allen de 1983. “O filme, que se passa nas décadas de 1920 e 30, fala sobre Leonard Zelig, um homem desinteressante que tem a capacidade de transformar sua aparência na das pessoas que o cercam. Rapidamente ganha fama internacional como um camaleão humano”.
Já no filme “Lisbela e o prisioneiro”, que se passa no nordeste brasileiro, o personagem de Bruno Garcia vai passar um mês no Rio de Janeiro e volta chiando mais do que panela de pressão.
E não precisamos ir muito longe. Temos camaleões aqui na capital espacial do Brasil, cidade do sol e também dos camaleões. Não só aqueles que os bugueiros mostram aos turistas quando eles surgem brilhantes nas dunas provocando tanto frisson quanto um rock star. Como eu já disse, existem camaleões em tudo que é lugar.
Um dia desses eu estava na loja Bike Aventura e descobri que o dono, o empresário e biker Josmar, também é um camaleão. Ele estava negociando por telefone com um fornecedor do sudeste e notei que sua voz estava diferente. Então sua mulher que estava presente me contou que ele vai mudando a voz, o sotaque, de acordo com cada fornecedor, de acordo com o lugar de cada um: Rio, Sampa, etc.
Eu também sou assim. Na época que eu estava à frente do Costa Branca Eco Resort, minha mulher Joane me dizia que eu, em um mesmo dia, falava paulistês, português de Portugal, etc. e tal. Bastava um minuto com um hóspede e eu já estava conterrâneo dele.
E para quem precisa de uma ajudinha, lembro que no bairro de Santos Reis, aqui em Natal, tinha uma placa: “Ensina-se carioca”. Nem sei se essa placa ainda existe. Portanto, se alguém vir um carro parecido com o meu por lá, é mera coincidência. Até porque nem preciso desse tipo de ajuda: tenho falado constantemente pela internet com minha amiga Isabelle Cabral (uma natalense completamente carioca) e eu estou com o meu carioquês afiado – pego sotaque até por e-mail.
Você também é um camaleão?
Para Robert Segal, no texto “Década de 1980: Quando todos podiam ser camaleões”, “quem se dispôs a circular pelas tribos na década de 1980, sem preconceitos, talvez tenha tido a chance de ter vivido aquela década como um camaleão. Qualquer um pode ser um camaleão, e não somente o David Bowie”.
Então é isso, caro leitor, cara leitora, não vamos terminando por aqui… Então é isso e muito mais! Afinal, um post-camaleão não pode ter fim…
Carito